domingo, 15 de novembro de 2015

Pequenas gotas de mim

Lembro-me da descoberta mais dolorosa
da minha infância, no extremo da 
minha mão.

A dor do corte
Da navalha afiada
que cortou a pele macia dos meus dedos
quando eu tinha apenas nove anos.

Descobri o sangue que havia em mim
E que correu de gota em gota os
cômodos da minha casa.

O corte no meu indicador
Me fez lembrar das carnes de açougue
que eram fatiadas por terçados.

Me vi pendurado naqueles 
ganchos cobertos por ferrugem

Aquele sangue era eu
Eram pequenas gotas de mim.

Meu pai limpou o sangue das lajotas
com álcool etílico.
Senti o cheiro de uma perícia criminal
vindo diretamente do chão

Eu sabia que não iria morrer.
Meu pai limpou meus dedos.
com água corrente e sabão.

Cobriu meu machucado com um band-aid
E me afastou da navalha, mantendo-a longe
de mim, como se faz com os alcoólatras.

Nunca mais quis enxergar uma navalha
em toda a minha vida.
Certas coisas é melhor não descobrir.


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