sexta-feira, 5 de setembro de 2014

Os Prisioneiros Tropicais: Retorno à Ilha da Solidão

   Sinto visitar um imenso porão de livros numa ilha deserta.  A ilha tem um aspecto amarelado. Seu céu é amarelo. Vejo um homem magro, de terno prateado e sem brilho. A pele dele é pálida. Tem sombras altamente escuras ao redor dos olhos (pretos, no sentido de maquiagem). Ele possui um cabelo loiro, volumoso, arrepiado. O homem é melancólico, cabisbaixo e atende pelo nome de N. Não estou mais no porão. Estou na beira dele, sentado na areia branca. Além do homem melancólico, percebo a presença de um lenhador. Este é gordo, barbudo, com chapéu de palha, camisa vermelha quadriculada e calça de cor carmesim. 

  O lenhador não sabe da existência do homem melancólico. O lenhador só corta, com sua serra elétrica, as palmeiras da praia, uma à uma, até sobrarem três. As lágrimas do homem melancólico se transformam em sangue quando tocam a areia. Areia vermelha. Confesso que nunca havia visto aquilo antes. O homem melancólico me deprime. Não posso e nem quero ajuda-lo. Estou exausto da idiotice das experiências humanas. Até a brisa daquela praia cortam o meu rosto, mas não vejo sangue algum. Depois percebo que o meu sangue está nas veias do homem melancólico. Estão em suas lágrimas. Como ele roubou meu sangue? Não sei. Nem estou interessado em saber. Quero ir embora. Dou meia volta e começo a caminhar, para ver se encontro alguma trilha que, no mínimo, me leve à outra extremidade que me isole do homem melancólico e do obeso lenhador da serra elétrica. 

   Num trecho do meu percurso, me deparo com um buraco quadrado, com bordas de madeira, no chão da praia. Lá embaixo vejo uma escuridão aterradora. "Não podemos sair", alguém diz. "Sombras estão se mexendo aqui no escuro. Somos tudo aquilo que não sabe entrar nem sair. As sombras tem vida própria...e não podemos sair".

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